01 dicembre, 2013

A propósito de regalias

  Abro este post com um cumprimento episcopal. Contou-me um amigo clérigo que participando de uma reunião entre "Excelências", enquanto secretario se seu ancião Superior, pode ouví-lo resmungar sobre um bispinho que ia passando diante deles revestido com todos os seus "arreios": veja e aprenda filho, quanto mais enfeitado o cacique, mais vazia a sua oca! Meu amigo, surpreso, ficou pensando: oca corresponde a capoccia,  ou fidelium? Acho que, no dizer do bispo, correspondia à cabeça, à mentalidade, à "visão de mundo".
Alfinetadas episcopais à parte, o fato é que, quando se trata de "regalias", poucos são dispostos a ceder ao menos um passo. Falo, poucos, muitos poucos, pouquíssimos!
    Normalmente uma regalia é decorrente de um papel institucional, de um estado de vida. Muitas vezes a regalia é vista como um prêmio; outras, como um privilégio; outras, ainda, como resultado de ilícitas e desumanas venturas. Falcão, o grande jogador, teve um privilégio, uma regalia: a der ser considerado "l'ottavo re di Roma". Mérito de sua capacidade de levar o Time romano por excelência a várias vitórias, a conquistas de títulos inimagináveis; mas, principalmente, devolver a realeza aquela Roma maltratada por uma outra classe, em constante busca de regalias: a classe política. Estes, sim, buscam insistentemente por privilégios, por vezes desmerecidos, e apegam-se a estes como aquele personagem bíblico conhecido como "il Ricco epulone". Enfim, neste meio trafegam outros, como acadêmicos, profissionais liberais, eclesiásticos, por exemplo, que meritoriamente ou não, buscam, merecem, apegam-se, reclamam para si, privilégios, regalias. Pensando nisso, me vem em mente Jesus e sua sagaz, santa, indicação: que o maior seria servo! E valia para toda raça de gente, sem distinção: valia para os togados, os de enxada nas mãos, pros rendados,... E ao fim, a sabedoria bíblica ainda compendia que, a estes, no entardecer de uma vida devotada ao bem do mundo - pro vita mundi - não ficava outra coisa senão reconhece que somo servos inúteis. Jesus sim, que sabia tudo!
Cappello dottorale in Scienze Sociali - Angelicum
   Nestas últimos dias, de preparação para a defesa de minha tese doutoral - nos centros acadêmicos pontifícios ainda se usa este termo, tão démodé, defender; prefiro mais de outro termo, mais conforme com o que realmente ocorre naquele dia, discussão - tenho refletido sobre uma regalia que me corresponderá, o de doutor. 
   Bem, muito tempo atrás, quando um amigo tornou-se doutor em filosofia, postou no Face um post no qual reclamava para seus pares o título exclusivo de "doutor". Cinque pensando al mosso Brasil, onde todo politico, todo médico, todo advogado e toda autoridade e revestida da toga doutoral. Desmerecidamente revestida!

Dom Hélder: honoris causa pela Sorbonne
   Certa vez Dom Hélder Câmara, diante de toda sua autoridade e eloquência foi questionado por José de Brouker - a primeiro biógrafo do Dom, e um dos grandes responsáveis pela penetração de seus discursos entre os europeus - sobre seus estudos e sobre seu doutorado. Imaginei o Dom, ainda jovem bispo, meio desconcertado e muito desconcertante, respondendo ao seu biógrafo, autor de Les conversions d'un évêque: sou un bispo formado num seminário nordestino, o Seminário da Prainha, em Fortaleça, pelos Padres Brancos, franceses. Mas, o desconcerto do Dom bem que pode ter desconcertado seu biógrafo com a história que agora vos conto, do meu modo. Contará-lhe o Dom que certa vez, presidindo a Eucaristia numa daquelas periferia do Rio de Janeiro, no momento do velho "sermão", um homem do povo interferiu sua pregação chamando o de "doutor".
     O sermão insolitamente dialogado teve uma réplica por parte do pregador que insistia em dizer que não era doutor. O homem do povo disse que de tão bem que ele falava só poderia ser doutor; e, em seguida, submergindo a assembleia puxou um coro que em uníssono repetia: é doutor! É doutor! É doutor! O Dom era um doutor aclamado pelo povo, como outrora o era os presbíteros elegidos ao episcopado pelo rebanho a ser guiado. 
Atto accademico ad Oxford
   Bem, o que fazer? Primeiro: reconhece que existem doutores e doutores. Depende de um fator objetivo - o título - e outro, o exercício. Daqui decorrem os títulos de doutores honoris causa concedidos por muitas universidades por este mundo a fora. Aqui, também, eu seria prudente em afirmar que todo doutor "honoris" é merecidamente. 
   Na Itália, por exemplo, até uns 10 anos atrás, todo laureado recebia o título de doutor. Ainda hoje, passando uma olhada pelos interfones dos condomínios entram-se inúmeros nomes de inquilinos precedidos pelo título de doutor. Tem mais doutores Rossis - o que equivale aos comuns doutores Silva e Santos brasílicos - do que chuchu na rama, como diz o velho dito brasileiro. Hoje as coisas, desde o ponto de vista legal, mudaram; mas, prove você a mudar esta quase secular tradição italiana! Basta pensar que, o Decreto de 1938 atribuía o título pois o máximo grau acadêmico obtido era, aposta, o de laureado. Depois da laurea, normalmente com duração de três anos, o estudante universitário era considerado doutor. Nada de bacharelados, licenciaturas, pôs-graduações, mestrados, doutorados, pôs-doutorados,...o que contava, após aqueles anos, era o exercício que comportava a obtenção do título e a produção acadêmica. A nível italiano, somente após a assinatura da Convenzione di Bologna que as coisas mudaram pois estabeleceu-se que, entre os países assinantes, trabalhar-se-ía para a dar uniformidade aos títulos conseguidos dentro da Comunidade Europeia. 
  Vamos à nomenclatura! No mundo anglo-saxão o título é atribuído com especificações e principalmente com abreviações detalhadas como, por exemplo, PhD, ou seja Philosophiæ Doctor

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