11 maggio, 2013

A crise espanhola


O espanhol é um povo de uma audácia e tenacia únicas. Sabe engenhosamente recomeçarem, sempre, quantas vezes sejam necessárias. Lembro-me das Espanhas que conheci: a pobre Estremadura, a Galícia rural, o Pais Basco - com sua excelente qualidade de vida, quase americano nos modos, céltico na mística,... Que olha para Madrid como o mostro subterrâneo que come, prepotentemente, suas riquezas; a Catalunha e Valencia com seu futurismo arquitetônico capitaneado por Gaudi e Calatrava; o folclórico sul espanhol com seu passado mozarábico, sua fé popular arraigada e atrelada na contrarreforma católica - é sim, ainda estamos ali -; e Madrid, a transgênica cidade, almodoviana capital, com um pé no presente e outra no passado. Capaz de transformar refluir numa mesma cela o generalíssimo Franco e esquerdismo de Zapatero. A Espanha é assim, caminha carregando simultaneamente dentre de si seus vários passados. Parece equilibrar seus antagonismos: Opus Dei e Neocatecumenal, La Macharena e a Virgen de Pilar, o emigrante magrebino e emigrante latino,... A Espanha machadiana e unamuniana é assim!
Mas, nos últimos tempos, o que mais me tem atirado à atenção tem sido a gestão da grande crise econômica nacional. Quando comecei a frequenta-la, outra vez, a causa dos encontros com meu moderador da tese doutoral - um dominicano, irmão do inquisidor Torquemada, teólogo, discípulo di Pannicar, teólogo liberalmente de fronteira - pude acompanhar, olhando jostengerdernianamente desde fora, os passos da crise e os passos no reconhecimento da crise. No primeiro ano, 2006, vi a borbuja imobiliária de Valencia crescer. Os prédios pareciam fungos, cresciam da noite para o dia. Um ano, dois anos depois,... Buuuummmm! A bolha explodiu. Nos anos seguintes observei os indignados - participei pessoalmente a uma das manifestações, em Madrid - e a progressiva consciência de que a crise não era uma coisa mediática. Era real! O que hoje sei e não sei dizer é que: primeiro, ninguém atribui a crise ao governo Zapatero; secundo, a crise ainda está por ai, batendo na porta dos amigos e dos vizinhos; quando não, batendo em nossas portas. Dai vêm-me outras duas conclusões: a de que a crise só não colocou toda a Espanha de joelho porque uma parte não indiferente da economia vive do que acumulou no mercado externo, vive das consequências dos resquícios do sistema colonial; e, é justo destacar, o espanhol é um povo inovador, que traz dentro de si não somente o passado das descobertas dos avanços d'além-mar, da defesa sarracena, mas, um marcado caráter inovador.
Da crise que assolou toda a Península Ibérica, têm emergido grandes comissões de bairros, associações, creches, restaurantes populares, hortas comunitárias dentro de grandes cidades,... Tudo fruto da iniciativa privada. Viva a subsidiariedade! Antes que esperar pelo Estado, a população tem feito a sua parte economizando, organizando-se, associando-se para aliviar as dores da crise. Enquanto Estado não chega com soluções mais profundas, a população corre atrás de paliativos que mantém viva principalmente a certeza de que mesma na desgraça, não está só. Ao contrario do que se pensa a crise não gera o egoísmo e sim, ao menos no caso espanhol, faz nascer uma comunidade.

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